O meu convidado desta semana é o primeiro amigo que fiz quando entrei para a Escola Primária e um dos mais próximos desde esse dia. Passámos a infância, a adolescência, a vida de adulto e agora a paternidade juntos e por isso tinha muita vontade de poder contar com ele neste espaço. Muito também porque o Pedro foi também o primeiro de todos os meus grandes amigos a ser Pai… E logo de uma menina. Enquanto mudava a fralda e a roupa ao Sebastião, a nossa conversa começou exactamente por estes pontos. Bem sei que muda de pessoa para pessoa, mas o facto de ter um filho ou uma filha em primeiro lugar era uma coisa que para mim não era igual. Nunca escondi que fiquei muito feliz quando soube que o Sebastião era rapaz mas o estranho é que nem sei muito bem porquê até porque é um desejo meu ter também uma filha. Mas o primeiro ser rapaz era, de facto, uma coisa importante para mim… Talvez por ser mais parecido comigo e ser menos uma coisa à qual teria de me adaptar de repente… Talvez pelo instinto de protecção que acho que pode ser diferente… Talvez por nada disso ou por tudo ao mesmo tempo. Falámos então sobre isto… Sobre estas diferenças e se, na verdade, elas existem: “Até agora, aos 3 anos, não há nada de diferente para além de ser mais difícil e complexo de limpar quando mudamos a fralda! Mas a partir de agora acho que se vai começar a notar… Os meninos são um bocado mais brutos e tendem a ser mais mexidos que as raparigas, mas não muito mais que isso! Depois a partir dos 18 (risos)… No caso da minha filha espero a partir dos 30 (risos)… é que a coisa começa a ser diferente” Dou por mim a pensar que, apesar de o tom da conversa ser o de que não há grandes diferenças, esta resposta me evidencia que as coisas são diferentes… Mas talvez o difícil seja mesmo o pensar em um dia ser Pai de uma mulher e não de uma menina! Porque de facto, uma criança é sempre uma criança e talvez não existam cuidados extra por se vestir de azul ou cor-de-rosa: “Aí importa a ordem pela qual tiveste… Se tiveres uma rapariga em segundo lugar acho que tendes a ter mais instinto protector com a rapariga. Sendo a rapariga antes, acho que tratas da mesma forma. Eu acho que lido com as coisas tal como lidaria com um rapaz… Por exemplo se ela cai a primeira coisa que faço é dizer-lhe para se levantar e não ir imediatamente a correr ver se ela está bem… Até para avaliar se, de facto, ela se magoa” Com isto penso que talvez me tenha saído o tiro pela culatra! Mas faz algum sentido que assim possa ser… Com o Sebastião tenho de me habituar a uma infinidade de coisas mas quando um dia vier uma menina, talvez haja um retrocesso e tenha de me habituar às mesmas coisas de uma maneira diferente. São esquisitos estes pensamentos idiotas e um pouco pré-concebidos mas só o futuro poderá dissipar estas dúvidas. Contudo, uma coisa que não acho é que o que vou poder partilhar com uma filha seja diferente daquilo que quero partilhar com o Sebastião… O esforço e vontade de partilharmos alguns gostos vai ser completamente transversal a isso e não acredito que o sexo possa influenciar o tipo de coisas que fazemos com eles. Sejam filmes, brinquedos ou música essas coisas vão sempre existir e o Pedro está, de certa forma, de acordo comigo: “Música e filmes gostava que ela partilhasse algumas coisas comigo… Mas acho que isso é uma coisa que vem com o tempo… Quando era miúdo não gostava nada das coisas que o meu Pai gostava e hoje ouço e vejo tudo! Desde que ela não me imponha os gostos não sinto necessidade de intervir… Mas era bom que tivéssemos gostos parecidos, para ao serão podermos estar os 3 na sala em vez de cada um em seu lado (risos)..” Ainda assim há coisas que não se podem deixar de desejar: “Star Wars vai ter de adorar e o Fight Club também… Ah e era brilhante que ela gostasse de jogar Fifa 17… Íamos os dois para a Playstation e deixávamos a Mãe a ler no sofá”. Na verdade é isto mesmo que sinto… Estes são prazeres e desejos que acho que só os Pais têm e têm-nos independentemente dos filhos! No fundo o queremos é alguém com quem brincar e não vejo esta necessidade tão evidenciada nas Mães. É algo que muda mais na relação Pai/Mãe – Filho do que propriamente na relação Pai – Filho/Filha. O futebol como diz o Pedro é um exemplo disso: “Gostava e espero que ela goste de futebol mas não tenho opinião sobre o clube que ela escolha… Se ela quisesse ir ao Estádio, gostava que fossemos do mesmo clube para irmos os dois mas não era essencial! Até acho pode ter mais piada podermos ver um jogo em que ela seja de um clube e eu de outro para podermos gozar um com o outro… Meter-me com ela quando ela estivesse com um melão enorme. Acho que não era de todo diferente se fosse um rapaz.” Mas no meio de sonhos e possibilidades, o Pedro faz um cru chamamento à realidade: “Pode ser pessimista mas acho que os Pais não vão fazer metade das coisas que querem fazer junto com os filhos… A uma certa idade eles querem é estar com os amigos na festa sem estar a aturar os pais” Sei que também eu passei por isso, mas de momento prefiro continuar a sonhar que vai ser diferente…
Enquanto punha um pouco de Aero-Om na chucha do Sebastião para silenciar momentaneamente as suas cada vez menos tímidas tentativas de conversa (e poder ouvir-me a mim e ao Pedro na gravação da conversa), o Pedro reagiu com um: “Isso é uma invenção do caraças… Já nem me lembrava”. Com isto recordo a outra particularidade da paternidade do Pedro… O facto de ter sido o primeiro e ter sido Pai numa altura em que nós (os outros amigos) ainda achávamos que era algo que estava relativamente longe. Nessa altura, há já 3 anos, questionei-me várias vezes o que sentiria se fosse comigo e hoje em dia penso um pouco no que seria diferente se fosse o primeiro Pai. Decidi perguntar ao Pedro o que ele acha que é diferente em ser o estreante e se não haveriam coisas que podia ter aprendido a ver os outros: “Eu sempre fui muito relaxado… Sempre senti que temos cá dentro um chip instalado no cérebro e quando chega a altura, aquilo te diz exactamente o que fazer. Não precisas de te preocupar com 95% das coisas porque o instinto está lá e aparece quando é preciso. Há poucas coisas que te podem ensinar antes… Aqueles cursos pré-parto aproveitam-se poucas coisas que são pequenas estratégias técnicas, de resto tu mesmo sem saber já sabes tudo.” Mas terá sido igual ser o primeiro a passar por isso? Não houve nem uma dificuldade acrescida? “A coisa em que ser o primeiro a ter um filho se nota mais, é na mudança da tua vida… És o primeiro a ter de deixar de fazer algumas coisas e às vezes essa mudança é difícil para as outras pessoas entenderem. És o primeiro a não poder ficar sempre até às 6 da manhã numa festa por exemplo! Se não passares por isso é difícil perceber que comece a não te apetecer fazer certas coisas porque preferes ficar com a miúda em casa” “Se tiveres outros casais a ter filhos na mesma altura, isso é mais fácil porque consegues planear mais coisas em conjunto” Nisto tenho um súbito ataque de consciência, porque algumas vezes fui um dos que pedia ao Pedro para “beber mais um copo” e que não entendia bem o porquê de ter que ir “tão cedo”… Realmente creio que é preciso passar pelo momento de preferir ficar em casa simplesmente a olhar para o Sebastião do que fazer qualquer outra coisa para entender isso! E não só… Também é preciso passar por essa mudança de realidade, por essa alteração que é o ser Pai, porque ás vezes não é só o preferir: “O teu ritmo de vida é totalmente diferente… Eu sempre adorei vegetar no sofá e esse termo deixa de existir. Tens sempre coisas para fazer… Por exemplo, ainda agora a Célia me ligou a pedir para ir comprar fraldas ao supermercado e sai de casa há 10 minutos. Não há um momento em que desligues! Mas, no entanto, isso é uma adrenalina boa… Tu até deixas de ter uma série de preocupações porque não tens tempo para pensares nelas (risos)! Podes continuar a fazer tudo… Sair, beber copos… Tens é de ressacar de uma maneira diferente (risos)! E acabou o estarem os dois de ressaca… No limite, deixamos a criança com alguém mas aí acordas ressacado e ainda com pesos na consciência a pensar “Deixei a minha filha com a minha mãe para agora estar aqui assim…”! Tudo requer um planeamento muito maior… Por exemplo, agora quando quero combinar um Jantar faço por tudo para poder ser em minha casa porque torna tudo muito mais fácil! E começas a valorizar muito mais almoços do que jantares…” As mudanças na nossa vida são mesmo enormes e muitas e misturam-se completamente entre boas e más: “O bom e mau são a mesma coisa… Aquilo que te deixa de rastos também é o que mais gostas…”
Voltando à relação dele com a pequena Ema, começámos a olhar um pouco mais para o futuro… É algo em que, como já devem ter percebido, eu penso muito e, conhecendo o Pedro como conheço, sei que ele também. Quais são então as coisas que o Pedro espera construir com a Ema… Aqueles momentos só dos dois que ele quer que aconteçam: “Churrascos no jardim… Adorava que nos Sábados de manhã, mesmo quando começar a sair à noite, gostasse de ir ao mercado com o Pai e depois fazermos um grande almoço em casa… Há outra coisa, e acho que isto não se pode publicar senão levo um tiro em casa… Tenho uma amiga tem o hábito de viajar sozinha com o Pai… Sem a Mãe, nem irmãos… Só os 2. Acho que isso era uma coisa que eu gostava muito” Apesar de parecer um pouco egoísta, subitamente tenho mais uma coisa para adicionar às muitas que quero construir com o Sebastião… Não é, obviamente, que o queira só para mim mas, de facto, há algo de muito aliciante em criar este pequenos rituais de Pai – Filho… As mães já os tiveram 9 meses só para elas, acho que também temos direito a querer um pouco disso! Porque são muitas vezes esses episódios que ajudam a construir a relação deles conosco enquanto indivíduos e são eles que criam os laços, a cumplicidade que teremos no futuro… E essa cumplicidade é muito desejável, certo? “Quero que ela seja pragmática como eu… Que não seja dramática! Gostava de cultivar isso com ela… Se estivermos a ver alguém a dramatizar uma situação, adorava poder trocar um olhar com a minha filha e encolhermos os ombros sem dizer nada… Ela entender que aquela não é a forma de lidar com as coisas! Acima de tudo quero ter uma relação aberta…. Mas não demasiado aberta (risos)… A partir de uma certa altura também não quero saber tudo!!!” E de repente mais uma coisa em que, creio, será diferente em ter uma filha… São estas pequenas coisas que na minha opinião fazem a diferença que falava no início, e não o nosso papel enquanto Pais. Esse é sempre igual: “O Pai equilibra… É o elemento neutro que equilibra! Reduz o histerismo e diminui a preocupação… Regula e torna as coisas mais normais. As mães têm tendência a ter uma visão mais agitada e o Pai mesmo sabendo que haja situações mais stressantes deve ser o elemento mais estabilizante. O Pai tem de ter mais paciência…” Vai ficando cada vez mais claro que o ser Pai é uma coisa muito específica e cheia de particularidades. Muitas mudam de Pai para Pai, mas a base começa a parecer muito semelhante para todos com que vou falando…
Ah… Quanto à recorrente pergunta da chucha, neste caso não precisava de a fazer porque o vi acontecer algumas vezes… Mas posso confirmar que é verdadeira: “Depende de há quanto tempo a Dona Elisa tiver limpo a casa… Se tiver acabado de sair vai logo para a boca, senão vejo se há um cabelo ou outro. Se a Ema se importar muito digo-lhe para ela ir lavar senão pode meter na boca. Quando a Mãe está manda ela, portanto eu aí não tenho de me chatear!”
Para a semana voltarei de novo, mas desta vez para ter uma conversa de um só sentido com um “Pai” muito diferente e apropriado à altura em que estamos…