Apesar de ser a melhor experiência do mundo, vamos ser sinceros… A Paternidade também traz uma série de alterações não tão boas! A verdade é que ficamos sem tempo para muitas coisas… Tudo tem de ser avaliado de antemão! Há sempre um biberon, uma fralda para mudar, um olho que tem de estar alerta… O Sebastião até é muito calmo, mas a verdade é que pela primeira vez na minha vida, tenho muitas vezes vontade de ir cedinho para a cama porque é muito comum acabar o dia completamente exausto! Nem consigo imaginar o que aconteceria com dois bebés! Por isso, esta semana, convidei o Gustavo González que é Pai do Lourenço e do Afonso… que são gémeos!
“É como trabalhar numa fábrica… É uma autêntica linha de montagem” diz-me o Gustavo. Só pensar numa simples coisa como o banho faz-me ficar de cabelos em pé… Não é que custe muito, mas pensar que cada vez que acabo de dar banho ao Sebastião teria de começar tudo de novo, enquanto ouvia o Sebastião a chorar porque já tem fome, é assustador! Muitas vezes penso que esta experiência é uma pequena loucura mas pensar em tudo a dobrar é de perder a cabeça. E se para mim isso é cansativo, como é para o Gustavo? “É alucinante… Eu uma vez, de mota, adormeci num semáforo a ir para o trabalho. É um cansaço extremo acordar vezes sem conta a meio da noite, por exemplo… Sei lá quantas vezes eles beberam mais ou menos pó do leite quando acordava a meio da noite para fazer 2 biberons (risos)… A verdade é que cresceram os dois bem (risos)” Eu próprio desconfio que nem sempre o meu filho terá bebido as medidas certas… certamente que com 2 isso não aconteceria! Mas pode este cansaço influenciar muito a maneira como olhamos para a Paternidade: “Eu nos primeiros tempos não achei assim tanta piada… Vives só para aquilo. Para mim não foi aquela felicidade imediata que se conta… Eles quando foram para casa tinham de comer de 3 em 3 horas e foi um instante até ficarem com as horas desfasadas por isso não fazíamos literalmente mais nada! Mas depois as coisas começam a acalmar…Começas a criar rotinas e as coisas mudam. Começas a conseguir aproveitar um pouco de todas as fases. Agora é espectacular, continua a ser cansativo, mas é muito bom” O início pode ser diferente mas a verdade é que no fim de contas o sentimento acaba por ser o mesmo.
Outra coisa que me intriga em pais de gémeos, são as questões mais logísticas… Fraldas, por exemplo! O número de vezes que tenho de ir levar o lixo à rua aumentou exponencialmente desde que o Sebastião chegou… Tenho ideia de nunca mais ter visto o caixote do lixo vazio desde que ele nasceu. “Salvo erro, nos primeiros 2 meses nós gastávamos uma média de 470 fraldas por mês… Deviam dar-me uma percentagem da Dodot” Este número é absolutamente incrível de ouvir, mas quando penso melhor percebo que nem é só isto… A minha casa está totalmente desfigurada neste momento e pensava que não poderia estar pior, mas falando com o Gustavo imagino o que seria tudo multiplicado por 2! Carrinhos, ovos, trocadores, berços, roupas, etc… “A casa é completamente monopolizada por coisas deles, ao extremo… Todas as divisões. Mesmo os cremes, o leite e essas coisas têm de ser a dobrar porque acabam num instante” Fazendo nós o biberon do Sebastião com água engarrafada, que tenho ter aos litros em casa constantemente, entro em pânico por solidariedade porque fisicamente não teria espaço para mais garrafas… Mas pelo menos aqui o Gustavo está mais tranquilo que eu: “A certa altura fazíamos com água engarrafada ou fervida mas depois começas a relativizar… Eles até água da cadela já beberam por isso percebes que não consegues controlar tudo”
A expressão controlar tudo, é de facto a última coisa em que consigo pensar ao falar de gémeos. Para mim, a imagem que me vem à cabeça é um rebuliço constante… Será que corresponde à realidade “Outro dia, por exemplo, cheguei à sala e estava a carpete, o sofá, a cadela, a roupa deles, tudo cheio de farinha… Abriram o armário, sacaram o pacote de farinha e sujaram tudo…” É mais ou menos isto que penso ser uma constante na vida de pais de gémeos, mas por muito hilariante que seja este episódio, é algo que pode acontecer apenas com um filho… Estou certo que um Pai de gémeos já passou por situações bem mais atribuladas “Há uns tempos dei banho aos 2… Tirei o Afonso da banheira, estava a secá-lo e a vesti-lo rápido para ele não apanhar frio e acontece que o Lourenço decide fazer cócó na banheira! Ora, não posso largar um porque vai começar a fugir pela casa e ainda se constipa e ao mesmo tempo não posso deixar o outro todo sujo até porque começa a cheirar muito mal na casa de banho. Lá tive de trancar a porta para um não fugir, tratar de voltar a dar banho ao outro e só depois continuar com o processo normal!” É bem mais isto que imagino ser o dia a dia do Gustavo… Sinto que enquanto Pais estamos constantemente a ser postos à prova e que temos de estar atentos e tomar mil decisões por minuto. Ser Pai de gémeos, como percebo agora, é ter de ficar confortável com isto muito mais rapidamente: “Com gémeos aprendes a relaxar inevitavelmente… Não dá para fazer de outra maneira. Tens constantemente de relativizar o choro deles e acudir aquele que percebes que precisa mesmo de ti. Outro dia quando chegámos a casa, na garagem, tirei-os do carro e fugiram cada um para seu lado… E agora onde é que tu vais primeiro? Ser Pai de gémeos trabalha-te esse poder de decisão… De em segundos avaliares onde reside a maior probabilidade de haver um perigo! Do ponto de vista estratégico também te obriga a desenvolver mais planos… Agora, para entrar no carro sento um no lugar do condutor com a porta fechada enquanto prendo o outro e só quando o primeiro já está preso é que vou buscar o outro” Vejo que esta situação é então um parodoxo. É muito mais exigente e cansativa mas obriga a desenvolver as skills necessárias a um Pai muito mais depressa… Simplesmente porque um Pai de gémeos não se pode dar o luxo de se preocupar com qualquer coisa irrelevante. E certamente aprendemos a olhar para certas coisas com outros olhos: “Uma ida ao parque não é uma coisa tranquila… Mesmo se os levares pela mão, ficas sem mãos para nada, nem para atender o telefone! Eu detestava mochilas e neste momento sou um grande grande adepto (risos)”
Um outro aspecto dos gémeos sobre o qual quis ouvir o Gustavo, foi a individualidade deles. Inevitávelmente, sempre que olhamos para gémeos temos tendência a agrupá-los numa só pessoa e acho que isso deve ser um desafio muito exigente para um Pai: “Tentamos não os vestir de igual e esse tipo de coisas… Temos de perceber que cada um deles tem o seu carácter e personalidade e para além disso, o pediatra alertou-nos para que se os vestíssemos de igual eles iriam ser muito mais competitivos um com o outro porque se sentem muito idênticos” Na realidade eles são 2 pessoas que podem até ser muito diferentes, o que me leva a pensar que isto traz outro tipo de dificuldades… “Nunca sei se devo castigar os dois quando acontece alguma coisa que não se sabe quem foi… Isso é muito tramado, perceberes o que fazer nessas situações! Mas muitas vezes quando um fica de castigo, o outro vai também por solidariedade mesmo que 5 minutos antes andassem à bulha.” E não é só isso… Mesmo os gostos podem ser muito diferentes entre eles: “Tens de te desdobrar mais claro… Se um gosta mais de jogar à bola e o outro de brincar com carrinhos, vais ter de jogar à bola e brincar com carrinhos” Mas e então se um Pai preferir muito mais brincar com carrinhos do que jogar à bola? Não há um receio de criar uma certa injustiça? “É possível que inconscientemente dês uma certa preferência aí e vou ficar a sentir-me muito culpado se me aperceber. Mas acho vais acabar por fazer as 2 coisas… Mesmo continuando claramente a não gostar de uma delas” Acontecendo isto nos gostos deles, decerto que é uma coisa que também acontece nas rotinas e o Gustavo acaba por desmistificar uma ideia que sempre tive de que com gémeos tudo acontece a dobrar ao mesmo tempo: “Sempre tentámos sincronizar tudo mas eles não são relógios… E é um mito de que eles se acordam um ao outro! Acontece muitas vezes um acordar a chorar e o outro não… O problema é que quando o primeiro se acalma, acorda o segundo (risos). E muitas vezes quando um come o outro não tem fome por isso é muito difícil normalizar as rotinas todas. Apesar de tudo, isso até te pode ajudar… Há birras que um faz mais que outro… Também adaptas a tua estratégia por aí sobre que faz primeiro o quê.”
Terminamos então com a pergunta da chucha no chão, com e sem mãe: “Se não estiver muito suja, vai directa para a boca deles… Se tiver um bocado suja e a Filipa não estiver por perto, passo pela minha boca e ponho na deles! Se ela estiver vou lavar e passar por água… Às vezes finjo só que vou à cozinha…” Apesar de a atitude ser, de certa forma, parecida com a minha, isto leva-me à realidade de por vezes o Gustavo estar sozinho com eles e lá me confessa: “Já cheguei a ficar sozinho em casa com eles durante 3 dias e invariavelmente quando a Filipa chega o que me apetece é ir para um hotel ou para um Spa…” Faço apenas mais uma provocação… Como será quando vierem mais? Será que é algo em que o Gustavo pensa: “Gostava de ter mais filhos mas “borro-me” todo que saiam mais 2… De qualquer maneira, o próximo quando vier, por muito mal comportado que seja, se for só um vai ser sempre mais fácil…” Para a semana cá estarei novamente, agora ainda com mais certeza que não me posso queixar assim tanto de cansaço!